

Câmara aprova inclusão da carne na cesta básica, após votar o texto de regulamentação da Reforma Tributária
Jul 16, 2024
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Nesta última quarta-feira, a Câmara dos deputados votou o primeiro projeto de regulamentação da reforma tributária (PLP 68/2024). O texto aprovado trata das regras gerais dos novos tributos, tais como benefícios e majorações fiscais e alíquota média de bens e serviços.
A despeito dos debates calorosos dos últimos meses, não se pode olvidar o fato de que a reforma era ansiada pelo mercado. Sobretudo, em tempos de alta inflação e valorização recorde do dólar, é possível escutar os suspiros de alívio dos empresariado brasileiro, que se fez presente durante cada etapa de estruturação da nova regra fiscal, em tentativa de encabeçar as demandas dos seus respectivos setores. O bom, velho e famoso lobby.
E, para evidência e informação, os lobbies não serão demonizados neste texto. Por lobby entenda a articulação política de personagens do mercado que, estrategicamente, buscam pela defesa e manutenção de seus interesses no meio político. E, como tudo na vida, a prática do lobby deve seguir as regras do jogo.
Pois bem. Os lobbies, durante o processo de elaboração e aprovação da reforma, têm mirado em um grande alvo: obter o máximo de benefícios tributários para serviços e produtos dos seus próprios setores. E, especificamente, durante essa última votação na câmara, dentre os inúmeros lobbies investidos por setores de peso, como farmacêutico e alimentício, um setor se saiu vitorioso aos demais: o agro.
Nos minutos antecedentes ao início da votação, o relator do projeto na Câmara, Reginaldo Lopes (PT-MG) atendeu ao clamor da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), e incluiu no texto da Lei regulamentador da reforma a previsão da carne, queijo e sal como produtos da cesta básica nacional. O que garante a tributação de tais produtos à alíquota zero, ou seja, não tributados.
A sessão seguiu para votação e o benefício fiscal sobre a proteína animal foi aprovado por 447 votos a 3, representando uma vitória esmagadora da bancada ruralista. E, apesar da tradicional disputa travada entre direita e esquerda, a pauta agro recebeu apoio de todas as frentes, sob a justificativa de democratizar o acesso de produtos essenciais e gerar mais empregos ao setor agropecuário.
Faz sentido?
Até certo ponto, podemos dizer que sim. Em tese, a desoneração acarreta em preços menores e mais acessíveis à classe C e D. Além disso, preços mais competitivos ocasionam o aumento do consumo do produto, uma vez que integram a classe mais pobre à base consumidora, aquecendo o mercado e impactando diretamente o lucro dos produtores. Esse é o raciocínio defendido pelos apoiadores do benefício.
Tudo faz sentido, contudo, há ressalvas. Sem regra ou lei que obrigue os produtores a repassar o desconto dos impostos ao consumidor, não há garantia de que a população mais pobre irá se beneficiar com a isenção tributária sobre as carnes. Diante das brechas legislativas, ficará à livre escolha dos produtores o repasse total ou parcial dos benefícios, ou a sua retenção.
Em todo caso, o repasse do benefício será proporcional ao fomento do mercado e ao aumento das vendas. Mas, ainda assim, não é possível assegurar que a inclusão da carne na cesta básica irá beneficiar as classes mais pobres.
Qual o impacto do benefício para as contas públicas?
Vamos voltar ao momento das primeiras tratativas sobre as regulamentações da reforma tributária, em abril deste ano. Na ocasião, o Ministério da Fazenda apresentou o projeto Lei Complementar ao Congresso Nacional e, no relatório, estimou a alíquota média de 26,5% para o IBS e CBS. O cálculo da taxa considerou os benefícios previstos na proposta inicial da LCP nº 64/2024, em vista ao alcance da meta fiscal de arrecadação do governo.
Vale lembrar que, no texto inicial da Lei Complementar, a carne recebia somente o benefício de redução de base em 60%. Ou seja, a desoneração aprovada pela Câmara afeta diretamente a meta de arrecadação do Governo Federal e, por isso, está em descompasso ao posicionamento da Fazenda. A lógica é: mais benefícios, menor arrecadação.
Além disso, a Câmara também aprovou a trava de tributação dos novo impostos, estabelecida em 26,5%, conforme percentual indicado no relatório da Fazenda. Significa que, independente do cenário fiscal-econômico, não será permitido ao executivo majorar a alíquota em percentual superior à trava.
Essa regra impede o executivo de compensar a queda na arrecadação ocasionada pelo excesso de benefícios fiscais. Em outras palavras, a trava permite que o legislativo articule interesses do mercado em benefício próprio, por meio das isenções fiscais, e proíbe que a desoneração possa ser compensada. O cenário resultaria numa queda na arrecadação e no impacto direto das contas públicas.
Segundo o parecer do Banco Mundial, solicitado pelo jornal Folha de São Paulo, a inclusão da carne na cesta básica, majora os novos impostos em 0,5 percentuais, resultando na alíquota média de 27,2%. Nesse cenário, o Brasil ocuparia o primeiro lugar no ranking de maior IVA (Imposto sobre Valor Agregado) do mundo, ultrapassando a Hungria, com IVA de 27%.
A pauta seguirá para votação no Senado após o retorno do recesso parlamentar - a partir de agosto, e analistas estimam que a aprovação do benefício das carnes, dificilmente, será revertida. Se os senadores fizerem mudanças no texto, ele volta para votação na Câmara, que dará a palavra final sobre o tema.
Aguardemos os próximos passos.